Estamos
acostumados a celebrar a bênção da saúde, pois saúde é coisa boa. Saúde: é bom
estado do organismo cujas funções fisiológicas se vão fazendo com regularidade
e sem estorvos de qualquer espécie; saúde é harmonia, equilíbrio, alegria,
enfim.
Mas
a realidade é que muitas vezes vemos a saúde fugir; órgãos importantes
apresentam problemas e aspectos e funções vitais de imenso valor são seriamente
prejudicados.
Adoecemos.
Adoecemos, com maior ou menor gravidade, na infância, na adolescência, na idade
adulta e principalmente na velhice. Às vezes a proximidade da doença é
anunciada, e podemos até preveni-la ou atenuar-lhe as conseqüências.
Outras
vezes, a doença é repentina e fulminante.
Pois
bem. Qual é a nossa atitude em relação à doença? É evidente que ela altera ou
perturba nossa vida e atropela nossos planos, sonhos, e vontade imensa de viver
com qualidade.
À
semelhança do rei Ezequias, e de minha experiência na mais recente
hospitalização, quero convidar o leitor a refletir comigo sobre A BÊNÇÃO DO
ADOECER. Como notamos no texto de Isaías, acima reproduzido, disse o rei,
depois de sua grave doença e da intervenção divina a prolongar-lhe os anos de
vida: “Foi para meu benefício que eu
tanto sofri”. Que bênçãos, que descobertas positivas para existência humana
recebemos ou deparamos na doença? É o que desejo lembrar e assinala, sem
pretender exaurir o tema.
1. Quando
adoecemos, descobrimos nossa finitude e humanidade. Não podemos tudo, não
conseguimos fazer tudo o que queremos, interrompem-se nossos projetos,
alteram-se nossos planos, damo-nos conta de
que com saúde nos
julgávamos necessários e até insubstituíveis; só que descobrimos, num leito de
enfermidade, que o mundo não pára, a vida continua e às vezes nossos
empreendimentos ou negócios chegam até a produzir mais.
2.
Quando adoecemos, tomamos consciência da unidade e solidariedade da raça humana.
Sim. Fazemos parte de uma humanidade pecadora, passível de adoecer e de
transmitir de geração em geração doenças ou potencial delas que freqüentemente
nossa indisciplina precipita que venham a aparecer. É o caso da cardiopatia de
minha avó e de minha mãe que me dispôs a problemas cardiológicos com que venho
padecendo há quase quinze anos. Espinho na carne com que tenho de conviver.
Pena que tenha herdado muito mais os defeitos que as virtudes do coração delas!
3. Quando
adoecemos, descobrimos que todos somos iguais: pobres e ricos, grandes e
pequenos, homens e mulheres, doutores ou analfabetos, palacianos ou gente de
rua, santos e pecadores. Todos adoecemos ou podemos adoecer. No leito da
enfermidade, descobrimos a tolice do orgulho, da vaidade, da pretensão humana,
da mania de grandeza. E do leito, saímos mais
humanos e humildes. E não isso uma bênção?
4. Quando adoecemos, aprendemos “experiencialmente” a natureza
relacional e interdependente do ser humano, e o valor da gentileza, da
simpatia, do bom humor, da paciência. Pensávamos, quando saudáveis, não
precisar de ninguém, não depender de ninguém, que dinheiro era capaz de
adquirir todo bem estar, todo prazer, toda felicidade. Doentes, em leito
hospitalar luxuoso ou singelo, rodeados de gente altamente capacitada e
profissionalmente competente, ou de gente simples, nós nos damos conta de que
precisamos dessas pessoas, dependemos delas, temos de tratá-las bem. Em troca,
recebemos o carinho e o cuidado delas. E como é bom ver médicos, enfermeiros e enfermeiras
e todo pessoal hospitalar, a trabalhar feliz e com diligência para nos prover
bem estar, alívio de nossas dores ou desconforto e recuperar nossa saúde ou
nossa esperança!
5. Quando adoecemos, verificamos a importância da família e do amor e
cuidado que nos devota. Às vezes, parentes que não víamos fazia anos,
comparecem em nosso quarto de hospital ou em casa, trazendo novo alento e razão
para viver. Até reconciliação entre parentes desavindos ocorre durante nossa
enfermidade, e só vamos saber depois. Como é bom ter família e ser família. Mas
também, enfermos, descobrimos o valor de nossos amigos, de perto ou de longe,
que nos levam carinho e solidariedade.
6.
Quando adoecemos, recebemos consolações novas e novos insights da Palavra e
Deus, se somos crentes em Jesus Cristo, tementes a Deus e acostumados a manejar
a Bíblia, o Santo Livro. O leito de enfermidade constitui privilegiado lugar de
meditação nas grandes verdades da fé, antes apenas parte de nosso discurso
religioso. Ali somos consolados por Deus e nos tornamos fontes de consolação.
É
verdade. A doença acaba abrindo espaços e cavando abismos em nossa vida que a
graça divina vem preencher. No leito, ouvimos a promessa divina, como Paulo
outrora: “A minha graça te basta, porque o meu poder se aperfeiçoa na
fraqueza”. Consolados e fortalecidos, mesmo com o corpo abatido e marcado pela
dor, passamos a ser agentes de consolação, de paz e esperança no hospital.
Chego à conclusão de que um verdadeiro cristão, doente e internado num
hospital, acaba se tornando ali uma bênção para profissionais da saúde e
companheiros de sofrimento ou tratamento.
7.
Quando adoecemos, verificamos a bondade de Deus ao prover multiplicidade de
dons, talentos e aptidões humanas no hospital, clínica ou pronto socorro em que
nos encontramos. Juntos, cada qual com seu conhecimento, sua técnica, seus
instrumentos, a cuidar de nós. Como nos sentimos importantes e também
descobrimos quão importantes são todos esses profissionais da saúde que atuam
como integrantes de uma grande orquestra, a abençoar e celebrar a vida!
Nossa
doença, complexa ou simples, permite o ensaio ou execução de todas as técnicas
e formas de cuidado humano em relação às enfermidades humanas. Esse ensaio ou
execução se tornam tanto mais eficazes quanto mais motivados movidos pelo amor
à arte de cuidar e principalmente às pessoas.
8. Quando adoecemos, baixamos “nossa guarda”,
como numa luta de boxe quando o lutador se sente extenuado e prestes a entregar
os pontos. Gente que se diz atéia, agnóstica, inimiga de Deus, hostil aos
crentes, mostra-se muito mais acessível, carente e pronta a pedir orações aos
que dela se acercam.
Estou
persuadido de que dos hospitais e centros de saúde costumam sair mais pessoas
reconciliadas com Deus, prontas para viver feliz ou morrer em paz, do que dos
próprios templos religiosos. A doença nos apequena, quebranta e oferece
oportunidade
à
graça consoladora do Evangelho!
9. Quando adoecemos, e levados para pronto socorro, hospital ou clínica especializada, descobrimos que existem outras pessoas com problemas iguais ou maiores do que os nossos. Com elas conversando, somos animados ou animamos, recebemos alento ou alentamos, sorrimos ou choramos. Descobrimos que somos gente como toda gente! E ao comparar com o nosso os fardos de enfermidade dos outros, muita vez ficamos agradecidos, porque o nosso é muito menor; ou, então, comovidos e prontos a interceder, porque o de nosso irmão é bem maior!
10.
Quando adoecemos, descobrimos as dimensões das mãos de Deus, através das mãos
humanas. Em verdade, nos damos conta de que as mãos hábeis e generosas de
homens e mulheres, profissionais da medicina ou simples auxiliares que nos
servem um pequeno lanche, um copo d’água ou limpam nosso quarto ou nosso leito,
constituem extensão das mãos de Deus. Olhando bem, essas pessoas constituem anjos
a rodear-nos e a mediar a bênção, a paz, a saúde ou a esperança com que
sonhamos!
Repito com Ezequias, depois de várias experiências de adoecer e ser hospitalizado, e submeter-me a sérias intervenções cirúrgicas:
“Senhor, por tais coisas os homens vivem, e por elas também vive o meu espírito.Tu me restauraste a saúde e me deixaste viver. Foi para meu benefício que eu tanto sofri...”
Irland Pereira de Azevedo
Boletim Informativo – 26 de fevereiro de
2012 e 04 de março de 2012
Nenhum comentário:
Postar um comentário